
16/10/2021
Ano 23 - Número 1.193
ARQUIVO
BHUVI LIBÂNIO

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“Adeus é apenas para pessoas que amam com os olhos. Porque para
quem ama com o coração e a alma, não existe separação.” – Rumi
Beatriz pegou o avental pendurado sobre um calendário, em um
prego torto na parede da cozinha e riscou o dia – “menos um longe de
você”. Da geladeira tirou cogumelos, uma cebola, um tomate – “da cor
dos seus lábios!” – alho, e molho Shoyo. Do armário, uma garrafa de
vinho – “ainda não tomamos vinho juntos” – e o espaguete. Buscou uma
taça e depois de passar água para tirar a poeira, serviu-se – “ao
tempo” – e brindou – “que ele não se prolongue tanto”. Tomou um gole,
fechou os olhos, lambeu os lábios – “mas o tempo não demora nem é
rápido, ele é o que tem que ser e... Espero aquele beijo. Ah! Espero.”
Depois do almoço, encarou o espelho enquanto fechava o pequeno
armário embutido acima da pia do banheiro. Esculpida em sua pele, a
voz do tempo lhe saltava aos olhos. Ainda não havia reparado aquele
novo detalhe: mais uma linha da história – “conhecemos pouco da
narrativa um do outro, um dia olharemos de perto os riscos e
sentiremos a idade da pele como dádiva. Quero lembrar seu cheiro.”
Mais tarde, seguiu sua rua até a avenida Atlântica e virou à
esquerda. Ao fundo, a Pedra do Leme arrancou um sorriso de Beatriz.
Com o olhar fixo, a mente leve e o coração em festa, seguiu pensando
nos cabelos, no olhar, naquela voz tão presente, mas ao mesmo tempo
suave. Queria ouvir seu canto, tocar o rosto dele com sua própria
bochecha e dizer nada, apenas mergulhar no oceano que ele carrega em
si – “como são bons os ventos, eles trazem, mas nunca levam o Amor
embora”.
Clarice e Ulisses esperavam ali, naquele mesmo lugar –
“todos os dias ele olha para você com tanto carinho! Essas patas
cruzadas na frente... Como é mesmo? Você disse que precisava ‘amar
novamente uma criatura viva’? Eu amo, Clarice. Um dia, quem sabe, ele
vem aqui pessoalmente te conhecer.”
Sentou-se ao lado da
estátua da escritora, e com os olhos percorreu os quatro quilômetros
de praia. Os pés dançavam na areia; eles riam e se deixavam tocar pela
água. Em verdade, eram um: encontro de almas. Distraída, colocou a mão
no peito e suspirou – “hoje o mar está azul e… Menos um pôr do sol
longe de você”.
Os olhos se encheram de palavras que vieram do
coração e se derramaram em um canto suave e íntimo, celebração da
beleza da vida.
“Você está aqui, nunca nos deixamos, mas ainda espero aquele beijo.”
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